sexta-feira, 15 de abril de 2011

Memórias...

Ouça na leitura!

22h40min...


Enquanto eu observava aquele sangue vermelho vivo descendo pelo piso branco, meus olhos apertavam com força nas ultimas lembranças que eu poderia viver. Seu corpo, seu calor, sua voz, seu beijo, tudo que eu adorava em você se fazia presente em mim enquanto eu encostava a cabeça no canto do banheiro. Do outro lado da porta, ninguém sequer imaginava que teriam que me encontrar assim, me preocupei com todos os detalhes, estava arrumada, perfumada e segurava na minha mão o primeiro presente que você me deu... Ou o resto dele.

Meu coração se fazia em mil pedaços e a cada lágrima que descia eu tinha a certeza absoluta que não iria mesmo conseguir conviver com aquela dor, a dor de ter que deixá-lo ir para tão longe, a dor de não ter certeza de mais nada, a dor de não conseguir ir em frente... A dor de falhar de novo. Levantei os punhos, fiquei observando-os por alguns segundos enquanto viajava em uma alucinação estranha. Seu cheiro ficava cada vez mais forte em mim e o gosto da sua boca começou a se acentuar... Abri a boca por duas vezes sussurrando seu nome, levantei a cabeça devagar e as paredes giraram. Caí.

Quando vi seus pés no canto do banheiro, tentei chegar até eles... Aquela sombra fraca, aquela insensatez, aquela embriaguez... Eu não conseguia me aproximar. Rastejei e escorreguei no rubro sangue e por vezes bati o braço no chão frio, os punhos doíam como nunca e meu coração estava fraco. Desisti e apenas levantei meus olhos para encarar seu rosto.

- O que você está fazendo?

- Estou tentando ficar com você!

Suas lágrimas pareciam tão reais, tão fortes... Meu corpo todo tremia e eu me sentia gelada, tudo girava e um arrependimento começou a correr meu corpo junto ao pouco de vida que eu tinha.

- Não faça isso amor.

- Não me chame de amor! - Cada grito meu era um protesto a tudo o que você me fez passar me encorajando a continuar uma caminhada que não me levaria a lugar algum. Eu não queria mais promessas que não poderiam ser cumpridas, não queria mais demonstrações de afeto que não existia... Não queria mais nada que viesse de um coração vazio.

- Eu não deixei você! - Senti suas mãos, mas não conseguia vê-las. - Apenas não poderia continuar aqui... Mas nunca deixarei de sentir o que eu sinto por você!

- Não... - Comprimi minhas mãos sujas com o restante de força que eu tinha.

Então senti seu toque em meus braços, uma força fez com que eu fechasse meus olhos e apenas ouvi o estalar de dedos, enquanto seu beijo em meu rosto me esquentou por momentos.

Não sei quanto tempo se passou, minha memória me levou para vários lugares onde eu pude estar com você novamente. Eu me chamaria de obcecada, possessiva, apaixonada, enlouquecida...

Eu me chamaria de amante.

Me chamaria de maluca.

Me chamaria de "sua" se eu pudesse.

Meu corpo trêmulo se esquentava pouco a pouco enquanto minhas lembranças te traziam até mim, com seu jeito de dizer olá, sua forma doce de saber o que acontecia comigo ou aqui onde eu estava. Todos seus conselhos adultos e sem nexo, seu jeito estranho de me encarar...

Eu era uma criança em seus braços e agora sem você, precisava aprender a caminhar.

Me sentia dolorida por dentro e por fora.

Então abri meus olhos, estava deitada no chão do banheiro, respirei profundamente como quem está sem fôlego e tentando voltar a si, se afogando lentamente. Olhei atentamente para todos os cantos e tudo estava perfeitamente bem, limpo e em ordem. Meus pulsos estavam intactos, porém doloridos e o relógio marcava 22h40min.

Queria você aqui comigo... Como eu gostaria...

Então quando me levantei um papel dobrado caiu do meu bolso, em sua letra você dizia:

"Viva um dia de cada vez, afinal... nada como um dia após o outro... não se preocupe em ser notada e sim na saudade que as pessoas sentem de você pelo que você é...

Não se esqueça, seja feliz! Não importa como, não importa onde...

Encontre-se e eu te encontrarei sempre..."

Então eu soube...

Você estava ali, não saberia dizer onde nem mesmo como...

Mas havia "você" em todo lugar...

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