domingo, 21 de setembro de 2008

All Star

Em passos lentos, ele caminha para algum lugar.


Johny era um cara normal.
Usava calças jeans e all star velho, não costumava ter muito dinheiro no bolso e quando o tinha estava sempre amassado misturado à moedas no fundo, sempre fazendo barulho ao andar.
Cabelo quase sempre despenteado, mas dando um charme extra a sua aparência. Não era do tipo de fazer sucesso com as mulheres, possuía um corpo magro alto sem muita força, pele branca e perfume natural bom.
Tinha amigos, uma roda de amigos que se reuniam na frente da sua casa toda noite de sexta para sábado. Cantavam ao som do violão as músicas mais marcantes do Legião Urbana e bebiam uma cerveja barata comprada no bar da esquina seguinte.
Lá no Bar havia um senhor meio gordo, Sr Carlos, que com a cara amarrada servia-lhe a garrafa, abria e entregava alguns copos descartáveis.
Johny sempre voltava com a garrafa em uma mão, copos na outra e um sorriso largo no rosto. Na calçada, ao pé da rua, estavam seus companheiros brincando com o baralho e preparando-se para a cantoria da noite.
Julio, Marcelo, Carine e Sulivan formavam a roda e Johny completava.
Depois disso, lá pelas 3 da madrugada, cada um seguia seu rumo, entrava em sua casa e desarrumava a cama com o corpo pesado.
Dormiam tranquilamente até o sol raiar no novo dia.

Johny teve que sair cedo. Trocou a roupa correndo, escovou os dentes sem olhar muito no espelho e pegou o velho all star de sempre jogado de qualquer jeito pelo quarto - cada par em um canto.
O cabelo permaneceu com o jeito da noite anterior, os olhos cor de mel brilharam ao olhar a mãe carinhosa fazendo o café.
Beijou-a no rosto ao passo que pegava um copo de café.
- Hoje vou procurar um emprego mãe.
- Oh meu filho. Boa sorte! - tocou-o com calma com as duas mãos.

Johny sorriu, pegou um pedaço de pão que estava no canto da pia e com o moletom antigo solto no corpo, saiu pela porta da cozinha.
O portão sempre emperrava, mas ele já tinha o jeito certo de abri-lo.
Realizou a artimanha e passo a passo pela rua que se secava lentamente após a chuva da madrugada, pensava quais os locais que iria visitar.

Chegava perto do metrô e parou por alguns instantes olhando o relógio da igreja central, do outro lado da rua.
Algumas senhoras devotas entravam para mais uma manhã de orações.
Johny sorriu. Adorava observar o comportamento humano.

Desceu as escadas do metrô e continuou caminhando pelo pátio principal.
O tempo frio - misturado ao vento - balançava-lhe suavemente os cabelos ondulados, que bagunçados permaneciam soltos pela cabeça.
Nos ouvidos, uma música chiada lhe fazia companhia.
Pegou então seu aparelho mp3, olhou se estava tudo certo com o fone e trocou a música, enquanto alguns passos lentos eram dados em direção à plataforma 1.

Johny já imaginava o presente que daria à mãe no mês seguinte - que seria o mês das mães. Tendo um emprego, tudo seria diferente. Poderia comprar roupas melhores, all star's novos e estilosos, cortaria o cabelo ou pelo menos manteria uma carteira gorda no bolso da calça.

Johny viu o metrô que pegaria parado na plataforma, bateu rapidamente os olhos na direção do relógio e começou a correr para não perder sua vaga lá dentro.
Estava em cima da hora.
Já na porta, empurrou um jovem magrelo de óculos com alguns livros embaixo do braço.
O jovem caiu na plataforma olhando assustado para Johny, que dentro do metrô o observava pedindo desculpas conscientemente.
A boca se mexia com calma tentando fazer o jovem caido do outro lado entendê-lo e então a porta terminou de se fechar e o metrô partiu.

Lucas, o jovem de óculos, caído no chão, levantou-se com raiva por ter sido impedido de entrar naquele metrô.
Começou a calcular qual seria a explicação à sua professora por chegar atrasado na aula e voltou-se para o banco perto da parede, esperando o próximo metrô com o mesmo destino.

Alguns minutos depois, um clarão se fez presente no túnel do metrô, no lado que Johny havia ido.
Explosão, terrorismo, o que fosse. Johny havia morrido no acidente do metrô.

Lucas não foi para faculdade naquele dia.

Os amigos de Johny ficaram arrasados e por algumas semanas não se reuniam mais para tocar e cantar.

A mãe dele, chorou por meses seguidos.

Anos depois, Sara, mãe de Johny, sofreu um infarto. Com emergência, foi socorrida no Hospital Municipal e atendida por um jovem médico chamado Dr Lucas Serafim.
Os olhos verdes por trás das lentes dos óculos adentraram o olhar sofrido de Sara e invadiram-na por completo.

Ninguém sabia. Nem mesmo eles.

Mas foi assim que aconteceu.

1 comentários:

R.L. disse...

A-m-e-i!
Muito legal o blog inteiro (leia-se a parte que eu vi).Enfim... A simplicidade da escrita e as histórias prendem até o final. PARABÉNS